"OCUPA BRASILIA" DEPOIMENTOS, EMOÇÕES E MUITA LUTA
Sábado, 03 de Junho de 2017

IVONEI CLAUDIO FÃO
O Convite

Logo após a greve geral do dia 28 de Abril, as Centrais Sindicais, movimentos sociais, Confederações, Federações, Sindicatos e demais entidades representativas decidiram dar continuidade a pauta de lutas em defesa dos direitos dos trabalhadores, contra a Reforma Trabalhista e a Reforma da Previdência. Além de intensificar a pressão contra os Deputados e Senadores, buscou-se também o fortalecimento da discussão nas bases entre os trabalhadores e definiu-se como o dia “D” das mobilizações em 24 de Maio na cidade de Brasília, como forma de unir as classes trabalhadoras de todo o Pais na Capital Federal, para demonstrar a vontade popular em barrar as reformas, isso ainda em 04 ou 05 de Maio, antes do escândalo da JBS e toda a sua repercussão que ainda estremece o Planalto, já havia nascido o movimento “Ocupa Brasília”.
A organização
Nós como Sindicatos de Servidores Municipais, somos filiados a Federação dos Municipários do Estado do Rio Grande do Sul – FEMERGS, entidade representativa em segundo grau dos trabalhadores municipais, abrangendo atualmente cerca de 300 Sindicatos, onde além de sua Direção Executiva existe a subdivisão em Coordenadorias Regionais, sendo que cada uma compreende uma região do Estado com seu Coordenador, Vice-Coordenador e Secretário, buscando ofertar a todas as entidades de base, apoio técnico e jurídico no que tange a realização de Assembleias, mesas de negociações salariais, eleições sindicais, enfim, auxiliar no fortalecimento das instituições com suporte teórico necessário pra o enfrentamento e garantia dos direitos dos trabalhadores municipais.
A caravana
Buscando ativamente fazer parte desta história, a FEMERGS lançou o desafio de formar uma caravana estadual unindo seus Diretores, Coordenadores Regionais e Sindicatos de base para juntos marcarmos presença no movimento Ocupa Brasília, levando a bandeira dos municipários para juntar-se a luta das demais categorias, partindo de ônibus fretado percorrendo o Estado e recolhendo passageiros nos ponto de encontro até a cidade de Porto Alegre, última parada antes do início da jornada de aproximadamente 36 horas de viagem até a Capital Federal.
Os preparativos
Aceitando o desafio como Coordenador Regional dos municípios da Zona da Produção, realizei o contato com meus 22 Sindicatos de abrangência, buscando divulgar a iniciativa e agregar seguidores como representantes de suas entidades de origem, sabendo da dificuldade que seria juntar um grande número, tendo em vista o tempo necessário para o deslocamento em torno de 05 dias entre a ida e a volta, o que dificulta a adesão que muitas vezes depende além da questão financeira, da liberação dos trabalhadores em seus locais de trabalho. Na sexta-feira à noite encerrei minha lista com 01 representante da cidade de Novo Barreiro: Deoclesio Rossetto, 02 representantes da cidade de Cerro Grande: João Carlos Binello Broco e Elsio Antunes de Souza, 02 representantes da cidade de Frederico Westphalen: Onir do Amaral e Valnei Rubert.
A partida
Nosso ônibus partiu da cidade de Santa Rosa, seguindo por Santo Ângelo, Ijuí, Coronel Bicaco, Palmeira das Missões, Sarandi, Carazinho, até Porto Alegre, totalizando 28 municípios representados entre seus 46 passageiros, sendo eles: Almirante Tamandaré Do Sul, Alto Feliz, Balneário Pinhal, Bento Gonçalves, Camaquã, Campinas do Sul, Campo Novo, Canguçu, Capão da Canoa, Caxias do Sul, Cerro Grande, Charqueadas, Encruzilhada do Sul, Frederico Westphalen, Humaitá, Ijuí, Jóia, Machadinho, Mariana Pimentel, Maximiliano de Almeida, Miraguaí, Nova Esperança do Sul, Novo Barreiro, Pinheiro Machado, Pontão, Santa Cruz do Sul, Santa Vitoria do Palmar e Tenente Portela. Sendo necessário inclusive a compra de 10 lugares em outro ônibus para não deixar de fora ninguém que gostaria de participar, ficando desta forma nossa caravana dividida em dois veículos mas unidos no mesmo ideal.
Com o fechamento da lista do ônibus, criamos um Grupo no WhatsApp para facilitar a troca de informações e finalizar as últimas tratativas antes do tão esperado 22 de Maio, data da partida.
Como já havia participado de outras mobilizações, como as de Dezembro em Porto Alegre, tinha a experiência de que em grandes concentrações de pessoas geralmente a polícia ou tropa de choque se utiliza das bombas de gás lacrimogêneo, bombas de efeito moral e balas de borracha para dispersar a multidão, o que me causou preocupação principalmente na questão do gás pois sou asmático de carteirinha e não saio de casa sem os meus sprays de medicamento. Desta forma procurei no comércio local máscaras de carvão ativado pois havia estudado que seriam as recomendadas no caso de contato com o gás e através do grupo externei minha preocupação e me propus a adquirir por encomenda para os demais colegas que preferissem, sendo que acabei incluindo em minha mala uma caixa com 15 unidades e mais um óculos de proteção com elástico para proteger o meu óculos de grau que uso.
A estrada
Bom, na estrada não faltou momentos de integração pois eram muitos municípios com realidades diferentes, todos querendo trocar experiências sobre suas realidades locais, já outros curtindo um filminho comprado as pressas nos pontos de parada, alguns passando o tempo na sala de jogos e rolou até um ensaio geral para nosso Hino da mobilização, uma paródia que fiz sobre uma música do Raul Seixas onde ele alerta o ”Pedro” sobre sua dificuldade de se aposentar com a Reforma da Previdência (a galera de Ijuí disponibilizou o vídeo do ensaio no youtube com o título 2- Hino "Ocupa Brasília").
Também nos acompanhava a preocupação de mantermos informadas nossas famílias mesmo com a dificuldade de sinal de celular e não era surpresa alguém gritar “Onde a gente tá?”, pois a maioria era iniciante nessa história de chegar até Brasília de Busão.
Conforme articulação prévia, cada um levou algo para compartilhar pois sabíamos que na estrada não haveria hora e local definido para refeições, como por exemplo o queijo e os salames que levamos de Frederico para juntar com as cucas, bolachas, salgadinhos e até pepino em conserva para o picadinho. Tudo sem frescura pois estávamos entre amigos e colegas que sabem da realidade do serviço público, onde ninguém fica rico, mas aprende a ter o jogo de cintura necessário para sustentar sua família com o orgulho de seu trabalho no dia-a-dia.
A chegada
Uma das angústias que nos acompanhava era a previsão da chegada em Brasília, pois foi necessário algumas mudanças na rota inicial e para recuperar o tempo perdido em algumas paradas precisamos orientar os passageiros que não haveria tempo suficiente para tomar banho e fazer as refeições, sendo necessário optar por tomar um banho e pegar um lanche para comer no ônibus ou comer algo mais elaborado como um bufê livre e cortar o banho.
O mistério acabou as 05:30 de quarta-feira, quando acordamos em Brasília com o ônibus manobrando no Estádio Mané Garrincha, ponto de encontro de todas as caravanas oriundas das mais variadas origens de nosso país, e aos poucos fomos tentando nos organizar para o dia que estava começando cheio de promessas e incertezas.
A integração
Logo encontramos o outro ônibus com o restante da delegação da FEMERGS que havia chegado antes e foram nos ambientalizando com as dificuldades de se encontrar algo para o café da manhã e principalmente conseguir um banheiro descente, pois os banheiros químicos eram insuficientes e já demonstravam sinais de sobrecarga de uso devido ao grande número de pessoas.
Enquanto rolava uma roda de samba onde puxei pela última vez nossa paródia para aquecer, outros aproveitavam para organizar nossos materiais de divulgação como os banners, faixas e bandeirinhas que havíamos preparado para a mobilização, ao mesmo tempo que alguns cevavam o tradicional chimarrão matinal, espantados com a fila de ônibus que não paravam de chegar trazendo consigo representantes das mais variadas entidades que logo se juntavam para fotografias que eternizariam este dia histórico.
Depois de organizados fizemos a primeira caminhada em grupo, onde a maioria vestia a camiseta azul da Federação e levava consigo as bandeirinhas que havíamos preparado, momento que circulamos entre as demais caravanas e fomos até a Torre de TV de Brasília, tradicional ponto turístico, para mostrar a Capital Federal aos novatos e fotografar o grupo para posteridade.
No retorno da caminhada, nos dividimos procurando algo para comer na feira de vendedores ambulantes que ofereciam cachorro-quente, pastel, espetinho de gato e até cachaça para os apreciadores, sendo que escolhi com meus colegas de Frederico um cachorro-quente para iniciarmos o dia, sem sabermos o que nos esperava.
O tempo ia passando e devido a informações desencontradas entre os organizadores não sabíamos ao certo o horário de inicio da mobilização, o que nos levou a optarmos pela caminhada até o shopping mais próximo em busca de banheiros limpos e comida mais reforçada para nos sustentar na jornada imprevista até aquele momento, quase 10 horas da manhã na Capital Federal.
A marcha
Depois de suprida as necessidades básicas, reforçadas com uma porção de feijão e arroz com ovo frito, retornamos para o ponto de concentração no Estádio Mané Garrincha, onde os carros de som das Centrais Sindicais disputavam nossa atenção no bonito duelo de discursos em alto falantes que tentavam superar uns aos outros, até que os mesmos se uniram ao anunciar o início da marcha pela Esplanada dos Ministérios as 12 horas, gerando corre-corre entre os participantes que tentavam se juntar para seu local de partida, como em um desfile cívico que ordena seus integrantes por cores e bandeiras em um festival de representatividade, onde todos se orgulham em ocupar o seu espaço e levantar mais alto o seu estandarte nesta demonstração pura de democracia, onde todos tem a sua vez independente de origem e quantidade.
Nos agrupamos como uma mancha azul esperando nossa oportunidade que logo veio e confiantes entramos na avenida com nossas faixas e bandeirinhas verdes, vermelhas e amarelas (as cores do Rio Grande e da Federação), liderados por nosso incansável Presidente Vilson Weber que veio lá de Santo Cristo para amarar no pescoço a bandeira branca da FEMERGS, somando com uma bandeira do Brasil trazida por um colega de Bento Gonçalves e a minha do Rio Grande do Sul, velha companheira de muitas jornadas.
Seguimos em meio a multidão sob o sol escaldante e nos alegrávamos ao olharmos para frente e para trás, sem conseguirmos enxergar o início e o fim da multidão que caminhava entre os caminhões que nos acompanhavam, onde discursos acalorados se sucediam e nos incentivavam a prosseguir, ressaltando a importância da união dos trabalhadores contra as reformas que nos ameaçam e são conduzidas por uma classe política enraizada na corrupção, chefiados por um Presidente acusado em delações premiadas que não se afasta do poder, nos levando a concluir que os mesmos já não mais nos representam.
A invasão
Após mais de uma hora de caminhada, chegamos ao cordão de isolamento da polícia do Distrito Federal, a qual nos revistou as bolsas, mochilas e pertences e solicitou a retirada de quaisquer madeiras que sustentavam nossas faixas e bandeiras por questões de segurança, no que prontamente atendemos para seguir a caminhada pois nada possuíamos que não fosse necessário para demonstrar pacificamente nosso intuito naquele momento.
Alguns metros a frente nos agrupamos a sombra das árvores pois beirava as 14 horas e o sol nos castigava, principalmente os mais idosos de nossa comitiva, os quais seguramente ultrapassavam os sessenta, setenta anos de caminhada sindical e nos causava especial esmero por seu bem estar.
Eis que fomos surpreendidos por murmurinhos que anunciavam a chegada de um grupo mais audacioso, o qual com seu caminhão de som furou a barreira policial e abriu caminho para um grande grupo que o seguia, estes caracterizados com máscaras, bandanas e camisetas encobrindo o rosto, em ritmo mais acelerado passando por entre a multidão que olhava perplexa seus escudos de madeira, pedaços e pau e pedras que traziam nas mãos, demonstrando claramente a intenção de uma atitude mais drástica e contrastante dos demais manifestantes que assim como eu tentavam entender o que estava acontecendo.
A angústia
Neste momento inesperado onde estávamos a alguns metros de visão da rampa do Congresso Nacional, nos entreolhamos pois sabíamos que a calmaria não iria perdurar e preocupado já fui colocando minha máscara e orientando os colegas mais próximos a fazer o mesmo pois pressentia que logo iríamos necessitar de abrigo, o que não demorou a acontecer pois logo uma bomba de gás lacrimogêneo estourava em nossa frente, forçando a multidão a correr em nossa direção em busca de abrigo, nos separando de forma irreversível pois não mais éramos uma mancha azul e sim uma multidão multicor que buscava se abrigar da nuvem branca que o vento trazia em nossa direção, causando lágrimas, tosse e náuseas aos menos preparados que precisaram ser amparados por amigos e desconhecidos que buscavam simplesmente uma distância segura.
A opressão
Após este momento de tensão inicial não adiantava mais procurar os demais membros da delegação, pois se encontravam semeados entre a multidão, restando apenas colocar o óculos de proteção e partir em frente em busca das pessoas mais atingidas pelo efeito do gás, buscando entre as árvores os pontos azuis de nossas camisetas para acompanhá-los aos locais mais seguros na retaguarda.
Depois da primeira bomba de gás, elas não cessaram mais ao longo da tarde e o ruído que se ouvia eram os foguetes dos manifestantes e as bombas de efeito moral disputando espaço na Esplanada dos Ministérios, ao som dos caminhões de som que hora buscavam acalmar os mais exaltados e hora cobravam da tropa de choque e cavalaria um comportamento mais humanitário.
A nossa esquerda os prédios dos Ministérios eram constantemente atacados por pichadores ou mascarados que investiam contra os vidros e portarias resultando em estilhaços que logo eram reprimidos por bombas e investida de policiais, causando novo corre-corre e apreensão das demais pessoas abrigadas nas árvores próximas.
Na avenida de fundo víamos as tropas se deslocando constantemente visando resguardar os prédios e nos causava apreensão sem saber seu real intuito e perímetro de aproximação, nos empurrando para o gramado central onde vez que outra encontrávamos nossos amigos em pequenos grupos perguntando uns pelos outros e compartilhando relatos, como por exemplo, dos mais audaciosos que se posicionaram na linha de frente decididos a suportarem a pressão sem recuar.
A retirada
Cansado de tantas idas e vindas, decidi acompanhar um grupo de nossos colegas que decidiram ir até a frente da multidão, porém parei no caminho acompanhando uma enorme bandeira do Brasil que era carregada no gramado central por tantos anônimos que beirava a uma poesia, onde negros e brancos, gordos e magros, mulheres e homens esticavam seus braços para impedir que a mesma tocasse ao chão ou se encolhesse diminuindo seus esplendor de estender-se horizontalmente, momento em que não resisti em fazer uma filmagem buscando capturar aquele momento, inclusive gravando um helicóptero da polícia que nos sobrevoava e logo depois de finalizar meu vídeo, lançou em nossa direção mais uma bomba de gás lacrimogêneo dispersando a multidão e deixando claro que não estávamos em um ambiente de confraternização e sim de conflito.
A saída
Essa sequencia de voos rasantes das aeronaves militares tentando identificar as pessoas que depredavam o patrimônio público acabaram por afugentar a multidão que, guiados novamente pelos caminhões de som das Centrais Sindicais buscaram organizar uma marcha de retorno pela avenida, ao som de gritos de ordem caminharam lentamente até o Estádio Mané Garrincha.
Desnecessário buscar um agrupamento neste momento de dispersão, pois todos sabiam o ponto de encontro em nosso ônibus e cada um se movimentava como podia depois de mais de 36 horas de viagem e um dia agitado e nebuloso que poucas vezes permitiu uma trégua para sentar-se ao gramado e disputar um raro gole de água vendido pelos insuficientes ambulantes que também não previam tamanha multidão de trabalhadores.
Ao pôr do sol caminhei com a multidão no retorno que parecia tão distante, reclamado pelas alpargatas em cada passo dolorido mas encoberto pela bombacha que segura pela guaiaca completava minha figura de gaúcho que não buscava ofuscar os paulistas, nordestinos e demais brasileiros, más sim marcar nosso espaço como de costume na construção de nosso país.
A volta
No ponto de encontro o clima era de final da batalha, onde de direções diferentes nossos colegas iam chegando sozinhos e em grupos buscando um pedaço de grama para sentar e compartilhar as experiências vividas neste dia que ficará marcado em nossa memória, procurando saber dos outros e já tentando fazer uma contagem de passageiros para permitir nossa partida em meio ao comboio de centenas de ônibus que aqueciam seus motores.
Percebendo que a maioria dos nossos amigos já haviam retornado, me permiti sentir o frescor da grama sobre meus pés calejados, sentando com um grupo que já planejava nossa saída e os próximos pontos de parada, para um merecido banho e uma refeição respeitável, ao mesmo tempo que auxiliava a espalhar o aviso da importância de que todos que tiveram contato com o gás deveriam trocar de roupa na primeira oportunidade para evitar uma intoxicação prolongada pela continua exposição aos agentes químicos que se impregnavam em nossos pertences.
A viagem em comboio nos propiciava uma maior segurança, porém como efeito colateral de superlotar os pontos de parada, como em nosso jantar que só foi possível em um paradouro 7 horas após nossa saída da Capital Federal, onde havia grandes filas para tomar um banho que custava R$ 8,00 (oito reais) com direito a exatos 8 minutos de água nos chuveiros com temporizador onde a fila composta por uma miscelânea de pronúncias regionais e camisetas de entidades saía para fora do banheiro.
Novamente o local não ofertava um serviço condizente com a multidão que disputava um espaço no balcão para pedir um lanche, sendo necessário exercitar a paciência para matar a fome com um sanduiche ou pedaço de pizza, opções mais apresentáveis as 02 horas da manhã em uma cidade que já ninguém se importava qual era, tal o sentimento de exaustão coletiva que pairava no ar e era nítido nos semblantes desconhecidos e familiares que víamos perambulando nos corredores, procurando os colegas esparramados e os direcionando para nosso ônibus objetivando seguirmos viagem.
A repercussão
Assim como eu, muitos só conseguiram ter a exata dimensão de nosso ato através dos noticiários e redes sociais no dia seguinte, onde percebíamos que as opiniões seriam divididas e multiplicadas conforme cada interpretação, pois para uns foi uma grande manifestação da vontade popular e dos trabalhadores, contrastando com a visão de outros que buscavam exaltar os atos de violência e depredação do patrimônio público.
Realmente não podemos negar que ambos os fatos aconteceram e ainda dividem opiniões, como no meu caso que acredito que a galera mais exaltada poderia ter entrado em ação mais tarde, quando toda a marcha estaria posicionada próxima ao Congresso e os simpatizantes teriam a oportunidade de auxiliar no embate da linha de frente.
Não posso negar que tais ações nos chocam pois não convivemos com a violência em nosso dia-a-dia e no primeiro momento nos afastamos e procuramos identifica-los como “os outros”, deixando bem claro que não houve nossa participação nestes momentos. Porém depois quando a poeira baixa e a fumaça da queima de banheiros químicos diminui, podemos refletir no que leva essas pessoas a partir para a ofensiva deixando de lado faixas e cartazes e ocupando as mãos com paus e pedras? Seriam eles reflexos de nosso futuro cansados de tantas injustiças e corrupção, procurando dar um basta definitivo na festa dos ratos que acorre todos os dias, enquanto faltam remédios e atendimento digno na saúde, cresce o desemprego e não temos segurança nem mesmo no aconchego de nossos modestos lares? Quem nos representa realmente: uma classe política enraizada na corrupção ou os outros?
Assim como muitos colegas, me entristeci com as represálias propagadas nas redes sociais, jornais e emissoras de rádio, onde na maioria das vezes se procurou dar ênfase aos atos de violência e vandalismo cometido por um grupo de no máximo 400 pessoas, combatidas por policiais também exaltados e truculentos em alguns momentos, deixando de lado a mobilização pacífica de mais de 100 mil trabalhadores unidos no ideal de rejeitar as Reformas propostas por um Governo que já foi comprometido moralmente e simplesmente ignora a vontade popular.
Como é difícil em meio a tanta lama e informações desencontradas, provar que ainda existem pessoas sem compromissos partidários e que não desejam serem rotuladas como mortadelas ou coxinhas e sim apenas como cidadão brasileiro. Mesmo após tantas denúncias que demonstram que na realidade não existem ou são raros os Partidos Políticos que ainda estão ilesos a tudo isso, percebo o quanto a cegueira partidária limita nosso meio e nossa sociedade, em uma disputa que parece não ter fim e expõe as pessoas a defenderem partidos e pessoas como em uma religião suicida, onde já não importa os crimes cometidos e sim demonstrar uma superioridade, mesmo que vazia.
A chegada
Eis que após exatas 48 horas de viagem, no final da tarde de sexta-feira, piso na calçada em frente a minha casa, me despeço dos companheiros que não tenho dúvida foram forjados no calor da batalha, resultando em sindicalistas comprometidos com a causa da luta e defesa dos direitos dos trabalhadores e também retornam ao seu lar.
Descarrego toda a tralha que me acompanhou nestes 5 dias de odisseia, abraço minha esposa e filha que ansiosamente me aguardavam na chegada e após um longo e rejuvenescedor banho, procuro erguer minhas pernas para diminuir o inchaço nos pés, já pensando nos compromissos que me aguardavam na segunda-feira, pois lutamos o bom combate, no compromisso de seguir nossa missão de base para base, no fortalecimento da representatividade dos Servidores Municipais.

CLARICE INÊS MAINARDI
Para quem participou dos movimentos pelas DIRETAS JÁ em 1983, FORA COLLOR 1992, vivencio o FORA DILMA em 2016, estar presente no movimento OCUPA BRASÍLIA, no dia 24 de maio de 2017 deveria ser uma coroação do direito a livre manifestação, símbolo democrático, mas infelizmente não foi assim. A forma truculenta como a polícia atacou os manifestantes, mesmo tendo acompanhado as repressões da polícia de SP, do PR, do RJ e do RS nos últimos meses ainda assim fica difícil entender o que ocorreu em Brasília.

Para que possamos aprofundar um pouco mais nossa análise do ocorrido, vamos tentar lembrar os momentos mais violentos das grandes manifestações do passado. No governo Figueiredo, tivemos o triste caso do Rio Center, onde integrantes do exército, que não aceitavam a abertura democrática do país e, tentaram forjar um ataque terrorista que frustrou.

No período do Fora Collor, o então presidente tentou fazer uma manifestação maior a seu favor que fracassou, mas pela dimensão das manifestações que ocorreram, baseadas no movimento estudantil, serviram como prova que o país valorizava a recém adquirida democracia.

Nos movimentos FORA DILMA, a grandeza demonstrada pela então presidente é digna de respeito, pois considerando normal da democracia as manifestações sua única atitude foi declarar: “Prefiro as vaias da democracia do que o silêncio opressor da ditadura”.

Então o que leva o atual presidente reprimir de forma tão violenta a manifestação do dia 24, acredito eu, que estive lá e presenciei os fatos de que após o vazamento provando indiscutivelmente a participação do Temer, Aécio, e demais apoiadores deste governo em diversos crimes, que deixaram o país estarrecido, esperavam uma manifestação forte, mas não imaginavam que Brasília seria ocupada por quase duzentos mil manifestantes, de todas as partes deste país, numa clara demonstração de que a sociedade não aceita o projeto atual de governo, onde os trabalhadores são brutalmente atacados, e a multidão pede FORA TEMER, Diretas já, que todos possíveis ocupantes do cargo estão atolados na corrupção juntamente com o Presidente. Governo este que por sinal já vem desde o dia que assumiu tentando criminalizar as lutas e as organizações dos trabalhadores, quando se deparou com as milhares de pessoas usou de terror psicológico efetuando revistas, impedindo o povo de adentrar na praça carregando bandeiras ou faixas, isto certamente deixou um grupo de manifestantes enlouquecidos pois além de todos os direitos que estão nos tirando, além de estarem rasgando nossa Constituição de forma grotesca agora estavam tentando impedir o povo de entrar no lugar mais sagrado de nossa democracia. E conforme os meios de comunicação informaram um grupo de aproximadamente 20 pessoas mascaradas começaram a jogar pedras nos policiais que formavam um cordão de isolamento próximo ao gramado do congresso e colocaram fogo em alguns objetos (http://agenciabrasil.ebc.com.br). E aí talvez por rádio, não sei como foi tão rápida a ação de Temer, o bombardeio sobre os manifestantes iniciou, violento, cruel e desumano, pois o grupo de “vândalos” com certeza facilmente seriam dominados e retirados pela grande quantidade de Policiais que existiam no local, mas não, a intenção era amedrontar, massacrar os duzentos mil brasileiros que tiveram coragem de ir até lá e dizer, basta de corrupção, basta de reformas, queremos eleger um novo congresso, pois este, não tem mais legitimidade nenhuma para aprovar, definir ou palpitar sobre qualquer coisa referente ao futuro de nossa nação.Para isso, usou covardemente drones e helicópteros que lançaram bombas de gás lacrimogêneo sobre a população, mas esta bravamente resistiu por mais de quatro horas entoando seu desejo através de gritos de “FORA TEMER”.
Precisamos repensar democracia neste país, pois no ano de 2016, 2017 foram muitos momento trágicos que vivenciamos, governadores determinando que a PM massacre, agrida a população que não aceita mais tanto desmando, tanta corrupção, tanta mentira, o momento é crítico, muito crítico, pois vivenciamos um tempo em que Representantes eleito pelo povo, para exercer mandato político fala com tranquilidade que o congresso não pode ficar a mercê da vontade popular, que justiça do trabalho não deve nem existir, não é de espantar que alguns brasileiros já não possuem mais a paciência de ficar esperando pacificamente que esta máfia que está no poder tenha um lapso de consciência política e recue neste massacre contra a Constituição Federal e contra os trabalhadores deste país.

O que vivi junto com meus companheiros que estiveram em Brasília, foi extremamente forte e na volta em nossas comunidades também enfrentamos momentos difíceis, de desrespeito tão violento e desproporcional quanto a violência sofrida em Brasília, vindas de pessoas totalmente despreparadas e muitas vezes alimentadas pelo ódio plantado por este governo e alguns meios de comunicação contra os sindicalistas. Somos democráticos e aceitamos criticas fundamentadas, opções de vida e opções políticas pois sempre são manifestadas e imunes da carga de maldade e grosseiria, devem ser fundamentadas em diálogo e pautadas no respeito a opinião do outro, sem ofender a pessoa, pois somos com orgulho representantes de uma classe .

E os trabalhadores ao longo de sua história foram forjados na luta,por isso frente a tudo o que vivenciamos, resistimos, nos fortalecemos nos laços de amizade e fraternidade com os outros brasileiros presentes nesta busca de um país que respeite o trabalhador, os povos indígenas, que não existam mais vítimas de latifundiários, que sejamos iguais perante a justiça, que tenhamos todos direitos à dignidade como preceitua nossa Constituição. Estamos prontos para tantas quantas lutas forem necessárias, nossa próxima meta será a maior greve geral que este país já viu, só paramos quando nos forem garantidos os direitos já conquistados, e quando eleições DIRETAS E GERAIS renovem o rumo deste país.
Fonte: Sec. de Imprensa e Comunicação, Ivonei Claudio Fão e Clarice Ines Mainardi
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